domingo, 2 de outubro de 2011

Como comunicar a fé ?

O público acolhe informações de todo o género, e toma boa nota dos protestos e das críticas. Mas colabora sobretudo em projectos, propostas e causas positivas.

Características da mensagem
1. Positiva
João Paulo II afirma na encíclica “Familiaris consortio” que a moral é um caminho para a felicidade e não uma série de proibições. Esta ideia tem sido frequentemente repetida por Bento XVI, de diferentes maneiras: Deus dá-nos tudo e não nos tira nada; os ensinamentos da Igreja não são um código de limitações, mas uma luz que se recebe em liberdade.
A mensagem cristã tem de ser transmitida como o que realmente é: um sim imenso ao homem, à mulher, à vida, à liberdade, à paz, ao desenvolvimento, à solidariedade, às virtudes... Para a transmitir adequadamente aos outros, é necessário primeiro entender e experimentar a fé desse modo positivo.
Neste contexto adquirem particular valor umas palavras do Cardeal Ratzinger: “A força com que a verdade se impõe tem de ser a alegria, que é a sua expressão mais clara. Os cristãos deveriam apostar nela e nela dar-se a conhecer ao mundo”. A comunicação através da irradiação da alegria é a mais positiva das exposições.

2. Relevante
Em segundo lugar, a mensagem deve ser relevante, significativa para quem escuta, não somente para quem fala. S. Tomás de Aquino afirma que há dois tipos de comunicação: a locutio, um fluir de palavras que não interessam absolutamente nada aos que escutam; e a illuminatio, que consiste em dizer algo que ilustra a mente e o coração dos interlocutores sobre algum aspecto que realmente os afecta.

Transmitir a fé não é discutir para vencer, mas dialogar para convencer. O desejo de persuadir sem derrotar marca profundamente a atitude de quem comunica. A escuta converte-se em algo fundamental: permite saber o que interessa, o que preocupa o interlocutor. Conhecer as suas perguntas antes de propor as respostas. O contrário de relevância é auto-referência: limitar-se a falar de si próprio não é uma boa base para o diálogo.

3. Clara
Em terceiro lugar, a mensagem deve ser clara. A comunicação não é principalmente aquilo que o emissor explica, mas o que o destinatário entende. Acontece em todos os campos do saber (ciência, tecnologia, economia): para comunicar é preciso evitar a complexidade argumentativa e a obscuridade da linguagem. Também em matéria de religião convém procurar argumentos claros e palavras simples. Neste sentido, seria necessário reivindicar o valor da retórica, da literatura, das metáforas, do cinema, da publicidade, das imagens, dos símbolos, para difundir a mensagem cristã.
Por vezes, quando a comunicação não funciona, transfere-se a responsabilidade para o receptor: considera-se que os outros são incapazes de entender. Porém, a norma deve ser o oposto: esforçar-se por ser cada vez mais claro, até conseguir o objectivo que se pretende.


Qualidades da pessoa que comunica

1. Credibilidade
Para que um destinatário aceite uma mensagem, a pessoa ou organização que a propõe deve merecer credibilidade. Assim como a credibilidade se fundamenta na veracidade e na integridade moral, a mentira e a suspeita anulam o processo de comunicação na sua base. A perda de credibilidade é uma das consequências mais sérias de algumas crises que se produziram nestes anos.

2. Empatia

O segundo princípio é a empatia. A comunicação é uma relação que se estabelece entre pessoas, não um mecanismo anónimo de difusão de ideias. O Evangelho dirige-se a pessoas: políticos e eleitores, jornalistas e leitores. Pessoas com os seus próprios pontos de vista, os seus sentimentos e as suas emoções. Quando se fala de modo frio, aumenta a distância que separa do interlocutor. Uma escritora africana afirmou que a maturidade de uma pessoa está na sua capacidade de descobrir que pode “ferir” os outros e de agir consequentemente. A nossa sociedade está superpovoada de corações feridos e de inteligências perplexas. É necessário aproximar-se com delicadeza da dor física e da dor moral. A empatia não implica renunciar às convicções próprias, mas pôr-se no lugar do outro. Na sociedade actual, convencem as respostas que sejam cheias de sentido e de humanidade.

3. Cortesia
O terceiro princípio relativo à pessoa que comunica é a cortesia. A experiência mostra que nos debates públicos proliferam os insultos pessoais e a desqualificação mútua. Nesse campo, se não se cuida a forma, corre-se o risco de que a proposta cristã seja vista como mais uma das posturas radicais que estão no ambiente. Correndo embora o risco de parecer ingénuo, penso que convém demarcar-se deste enfoque. A clareza não é incompatível com a delicadeza.
Com delicadeza pode-se dialogar; sem delicadeza, o fracasso está de antemão garantido: quem era partidário antes da discussão, continuará a sê-lo depois, e quem era contrário raramente mudará de posição.
Recordo um cartaz situado à entrada de um “pub” perto do Castelo de Windsor, no Reino Unido. Dizia, mais ou menos: “Neste local são bem-vindos os cavalheiros. E um cavalheiro é-o antes de beber cerveja e também depois”. Poderíamos acrescentar: um cavalheiro é-o quando lhe dão razão e quando sucede exactamente o contrário.


Princípios quanto ao modo de comunicar

1. Profissionalismo
A “Gaudium et Spes” recorda que cada actividade humana tem a sua própria natureza, que é preciso descobrir, utilizar e respeitar, se se pretende participar nela. Cada campo do saber tem a sua metodologia; cada actividade, as suas normas; e cada profissão, a sua lógica. A evangelização não se produzirá a partir de fora das realidades humanas, mas a partir de dentro: os políticos, os empresários, os jornalistas, os professores, os guionistas, os sindicalistas, são aqueles que podem introduzir melhorias práticas nos seus respectivos âmbitos.

S. Josemaria recordava que é cada profissional, comprometido com as suas crenças e com a sua profissão, que há-de encontrar as propostas e soluções adequadas. Se se trata de um debate parlamentar, com argumentos políticos; se de um debate médico, com argumentos científicos; e assim sucessivamente. Este princípio aplica-se às actividades de comunicação, que estão a conhecer um desenvolvimento extraordinário nos últimos anos, tanto pela crescente qualidade das formas narrativas, como pelas audiências cada vez mais amplas e pela participação cívica, cada dia mais activa.

2. Transversalidade
O segundo princípio poderia denominar-se transversalidade. O profissionalismo é imprescindível quando as convicções religiosas pesam num debate. A transversalidade, quando pesam as convicções políticas.
Neste ponto, vale a pena mencionar a situação de Itália. Ao fazer a declaração de rendimentos, mais de 80% dos italianos assinala o espaço correspondente à Igreja, porque deseja apoiar economicamente as suas actividades. Isto significa que a Igreja merece a confiança de uma grande maioria de cidadãos, não somente dos que se revêem numa tendência política.

3. Gradação
O terceiro princípio relativo ao modo de comunicar é a gradação. As tendências sociais têm uma vida complexa: nascem, crescem, desenvolvem-se, modificam-se e morrem. Consequentemente, a comunicação de ideias tem muito a ver com a “cultura”: semear, regar, podar, limpar, esperar, antes de colher.
O fenómeno da secularização foi-se consolidando nos últimos séculos. Processos de tão longa gestação não se resolvem em anos, meses ou semanas. O cardeal Ratzinger explicava que a nossa visão do mundo costuma seguir um paradigma “masculino", onde o importante é a acção, a eficácia, a programação e a rapidez. E concluía que convém dar mais espaço a um paradigma “feminino", porque a mulher sabe que tudo o que tem a ver com a vida requer espera, exige paciência.
O contrário deste princípio é a pressa, que leva à impaciência e muitas vezes também ao desânimo, porque é impossível conseguir objectivos de entidade a curto prazo.

4. Caridade
A estes nove princípios seria necessário acrescentar outro, que afecta todos os aspectos mencionados: a mensagem, a pessoa que comunica e o modo de comunicar. O princípio da caridade.
Alguns autores destacaram que, nos primeiros séculos, a Igreja se expandiu de forma muito rápida porque era uma comunidade acolhedora, onde era possível viver uma experiência de amor e liberdade. Os católicos tratavam o próximo com caridade, cuidavam das crianças, dos pobres, dos idosos, dos enfermos. Tudo isso se converteu num íman de atracção irresistível.
A caridade é o conteúdo, o método e o estilo da comunicação da fé; a caridade converte a mensagem cristã em algo positivo, relevante e atractivo; proporciona credibilidade, empatia e amabilidade às pessoas que comunicam; e é a força que permite actuar de forma paciente, integradora e aberta. Porque o mundo em que vivemos é também com demasiada frequência um mundo duro e frio, onde muitas pessoas se sentem excluídas e maltratadas e esperam algo de luz e de calor. Neste mundo, o grande argumento dos católicos é a caridade. Graças à caridade, a evangelização é sempre, e verdadeiramente, nova.


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